Amílcar Vs IURD

O Amílcar já tinha ouvido falar deles. A sua mulher já lhe tinha falado neles. A sua filha já tinha andado enrolada com um deles. Sendo assim...porque não?

Pegou no folheto que lhe tinham deixado na caixa do correio onde se lia “Trazei todos os dízimos à casa do Tesouro, para que haja mantimento na minha casa; e provai-me nisso, diz o Senhor dos Exércitos, se eu não vos abrirei as janelas dos céus”.

Ora o Amílcar nem sequer era lá muito religioso mas era medricas. Muito medricas. Extremamente medricas embora costumasse bradar aos quatro ventos na tasca da esquina:

Eu estive em África! Tenho lá medo de alguma coisa. Ó Céu, mais uma mine!

Lembrou-se, de repente, que poderia ser esta a Céu a que o panfleto se referia. Já não era a primeira vez que ela o tinha deixado na rua. Não se preocupou. Viu a morada e lá se meteu a caminho do Centro Espiritual de Cacilhas.

Ao chegar lá, um cavalheiro de origem brasileira aproximou-se sorridente:

- Oi, sou o Padre Márcio.
- Qué-que-queres pá? Olha que eu não sou desses. Eu estive em África!
- Todo mundo é bem vindo. Africano, budista, prostituta...a casa do Senhor está aberta.

O Amílcar não sabia lá muito bem a que senhor é que aquele gajo mulato se estava a referir mas ouvindo falar em prostitutas, perguntou logo:

- E vinho tem?
- Mas é claro. Fazemos a celebração como Ele nos ensinou.

Cada vez o Amílcar gostava mais desse tal gajo sem nome. Vinho, putedo e um porteiro simpático. Já cá deveria ter vindo antes, o Viegas vai roer-se de inveja, pensou ele.

Quando entrou, deparou-se com pessoas a entoarem cânticos enquanto outras com um simples toque na cabeça se estatelavam no chão de forma espasmódica e a gritar por Deus. Outros gritavam aleluia.

Como estes gajos já estão...a pinga deve ser boa, pensou. Guardou o dinheiro e o cartão de sócio do Benfica no bolso da frente para não os perder e lá alinhou no grupo. Cantou, saltou, abraçou uma velha que ele achou já ser idosa demais para andar na má vida e fartou-se:

- Então e o vinho? O preto da entrada disse que havia pinga! Eu tenho dinheiro.

De imediato, outro cavalheiro (desta vez chamado Padre Nélson) aproximou-se dele com um cesto com algumas notas e moedas lá dentro.

“Olha, olha...o gajo pensou que eu lhe estava a pedir o troco. Mas eu ainda não paguei...”

Com o ar mais altivo que era capaz, levantou-se, pegou no dinheiro e desatou a correr pela porta fora gritando:

- Vão-se foder mais a merda de serviço. Desorganizados do caraças. Eu estive em África!

E foi gastar o dinheirinho do cesto na tasca da Céu.

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